Incêndio Azul

No sofá, a luz escorre por dentro dos pequenos buracos inchados de tecido. Ela reflete em fosfenos ópticos nas paredes da cozinha, da sala da estar, enquanto a senhora descansa acima da maciez enferrujada que é aquele sofá.

Enquanto eu estaria, caso possível em aplicabilidade prática, removendo teias de aranha líqüidas subseqüentes de minha cabeça. Faria um furo, uma pequena incisão, um protótipo de bisturi escavador, ou talvez colocar uma pequena toupeira lá dentro mesmo, para escavar para fora os pensamentos em excesso e arquivá-los em pequenos recipientes, pequenos vidrinhos.

Os mais densos seriam azul ciano, seriam duplicados, siameses, uma inversão térmica, uma Fata Morgana. Eventualmente a toupeira poderia extraí-los de meus dentes, onde as raízes se proliferariam em ramos, quem sabe formando uma árvore de pensamentos que eu PRECISAVA extrair de minha arcada dentária.

Obrigado, dona Toupeira. Acho que vou chamá-la de Molly. Oh bem, é um nome sujeito a alterações.

Mas voltando aos vidrinhos, acho que os classificados como azul ciano ficariam em um tubo de ensaio. Ensaio para propelar vários espetáculos, muitos deles talvez trágicos.

Oh, como amo o talvez.

O rosa seria ácido. Estaria em constante combustão. O rosa seria púrpura, teria um cheiro adstringente de camomila com sal grosso, algo que você pode sentir queimando os brônquios, algo que talvez você pusesse no dedão do pé para descamar cinco centímetros de calos e formações cutâneas relativamente rochosas. Oh bem. Acho que o rosa seria um dos mais perigosos, então vamos mantê-lo em uma trompa de vácuo. Lá ele não poderá fazer mal a ninguém.

Pelo menos não até que a então declarada Molly tenha já terminado de extrair e classificar de acordo com as regras da ABNT todas as colorações, densidades, ramificações e líqüidos em teias de aranha em excesso na minha mente.

Obrigado Molly. Você talvez tenha me salvado de uma combustão humana espontânea. Ou quem sabe teria sido interessante fazer parte de algum fenômeno desconhecido.

Um mar bioluminescente