Quando o silêncio psicodisléptico...

Engulo o silêncio, salientando-se, deglutição.
Empurrado da faringe até o esôfago, eclode em pequenas bolhas de ar a vácuo, em pequenos espinhos, porcos-espinhos, defensores do mal antes que ele seja perpetrado, defensores de si próprios e, por sua vez, aniquiladores dos específicos séquitos que algum dia já necessitaram.
A úvula permanece intacta, sem atrever-se a ressonar fonemas ou conjugar um pronome, uma palavra, um tom ensurdecedor que rasgue as películas que a asfixiam no estado de ausência sonora.
Abstenção e privação.
Sonoridade nula, ouriços sulcando a parede do estômago em metamorfoses silenciosas, o vácuo se transporta, se esfarrapa, se segmenta em um exército gaseificado, destilado, alcoólico, indigesto.
Silêncio que é regurgitado até o palato mole, segurado pela úvula em protesto, retornando em seu estigma.
Em meu estigma: meu silêncio.
É uma bomba de fusão termonuclear, hidrogenada, uma combustão humana espontânea sem precedentes, uma lava quente e mórbida, ácida e adstringente, um feto mal formado e prematuro.
Sim, meu silêncio é uma jaula complexa mais complexa que uma Navalha de Occam, que um Experimento de Schöedinger; uma jaula eventualmente singular por onde o supramencionado e fétido embrião de animal humano rasteja e fatiga.
O embrião colide nos demônios de Hieronymus Bosch, perpassa pelas escadas de M.C. Escher.
Exausto como uma formiga operária, derrete-se em um relógio qualquer de Salvador Dalí: meu silêncio tem uma pressão rarefeita, pois meu feto fica vasodilatado em altas temperaturas, em um inferno qualquer, dentre o Tártaro da Mitologia Grega, talvez até mesmo o Inferno de Dante.
Meu silêncio se transporta em aviões de papel, em barcos com furos maiores que seus olhos.
Meu silêncio tem olhos de Tarsier, esferas tão grandes. pesadas e curiosas quanto o próprio cérebro.
Ele é um astronauta, ele propositalmente se sufoca em uma galáxia longínqüa, medida por um espectrógrafo sensível. O protótipo disforme conjuga seus passos até a galáxia z8-GND-5296, com sal abaixo da língua, para manter sua pressão arterial, para não sucumbir a um possível desmaio, para não entrar em coma antes que seja salvo por uma palavra ou sonoridade qualquer.
Implode, se derrete, se cega, se priva dos sentidos, liqüidifica-se em suas próprias dimensões, reduz-se a um purê de incertezas que escorrega através de si mesmo em uma dinâmica de um artóprode, uma aranha pavão, um exoesqueleto duro, uma existência mole.
Dentro de um útero, em uma placenta, imagina o que não pode o observar, imagina o que o silêncio abnega, sussurra em voz muda.
O silêncio dos outros é uma afta que só fica dormente com altas esfregações de cocaína ou altas injeções de morfina.
É um quarto branco em um hospício onde mantém o estatuto da loucura, onde o convencional é tido como o esperável e "natural".
É um vácuo, é uma intersecção que se conecta com minhas bolhas fraquejadas por tentativas de suicídio, por repúdio àquilo que não posso alcançar com meus dedos de elfo, por aquilo que apenas poderia retirar meu império interior de um coma.
Pontos de interrogação que dobram-se em arcadas dentárias de ratos gigantes que reinam soberanos, vociferam sonoridades angustiantemente mórbidas.
Porém, minha salvação. É cientificamente comprovado que ratos podem rir.

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